A tese de que boa gestão de aspectos ambientais, sociais e de governança leva a melhores resultados financeiros de longo prazo já está bem estabelecida. Há diversos estudos demonstrando essa correlação quando olhamos para o mercado como um todo. Contudo, ainda é desafiador demonstrar como as boas práticas e a abordagem de gestão ESG adicionam valor financeiro em alguns casos específicos.

Afinal, por vezes essa é uma conexão indireta ou associada a riscos e oportunidades intangíveis, que varia de acordo com cada organização. Sem falar na variedade de nomes que atribuímos para as mesmas coisas, o que torna mais difícil monitorar o impacto específico de agendas amplas como a da sustentabilidade empresarial.

Até por isso, vale sempre lembrar que o ganho financeiro é um dos motivos pelos quais as organizações se engajam em sustentabilidade. Outras razões estão associadas a questões morais (é o certo a se fazer, diante dos desafios da humanidade) ou de gestão de riscos associados ao relacionamento com stakeholders, que cobram engajamento em causas relevantes, ou mudanças regulatórias.

As primeiras organizações a investir em sustentabilidade o fizeram porque entenderam que era a coisa certa a fazer, que o seu negócio só prosperaria em uma sociedade e meio ambiente saudáveis e porque desejavam perenizar sua atuação, ao qualificar suas relações com partes interessadas.

Ao longo dos anos, o mercado identificou que tais organizações conseguiram também gerar melhores resultados financeiros no longo prazo. Esse entendimento deu origem à onda de adesões apressadas à agenda ESG, marcada por uma busca irracional por soluções do tipo panaceia ou por listas pré-definidas de coisas a serem feitas para uma organização “se tornar ESG” (expressão que por si só denota falta de entendimento — a sigla remete a um conjunto de temas e boas práticas; não é uma categoria ou classificação).

Quando se entende que sustentabilidade é uma jornada e uma abordagem de gestão, a pergunta que emerge é: ok, como fazer? Há vários caminhos possíveis e hoje comento sobre um dos mais interessantes, que busca conciliar a busca por objetivos financeiros e sociais: a organização híbrida.

Proposta por Julie Battilana, Anne-Claire Pache, Metin Sengul e Marissa Kimsey em um famoso artigo na Harvard Business Review, a abordagem envolve quatro alavancas:

1) estabelecer e monitorar metas sociais juntamente com as financeiras;

2) estruturar a organização para apoiar atividades de cunho social e financeiro; 3) contratação e aculturamento de funcionários;

4) liderança ambidestra.

Não há espaço para tratar em detalhes, mas para cada um dos “passos”, há uma série de preocupações e boas práticas recomendadas pelas autoras com base em estudos de caso. Sobre metas, já tratamos aqui da importância de se construir um sistema com indicadores relevantes, tempestivos e que tenham peso adequado dentro do sistema de recompensa de quem toma decisões.

Na frente de estrutura organizacional, a recomendação é pensar sobre o modelo de negócios: “algumas atividades criam valor social e econômico ao mesmo tempo. Outros criam predominantemente um tipo de valor. Para atividades que criam os dois tipos, uma estrutura organizacional integrada geralmente faz sentido. Caso contrário, as atividades geralmente são melhor gerenciadas separadamente”.

Na formação e treinamento de equipes e formação de cultura, destaca-se a recomendação de equilibrar os perfis híbridos, que conseguem navegar tanto pelo ambiente de negócios quanto de impacto social, com os especialistas, que trazem conhecimento aprofundado e redes de relacionamento em áreas específicas. “Os funcionários de uma empresa que busca objetivos duplos tendem a ser bem-sucedidos quando entendem e se conectam tanto com o negócio quanto com a missão social”.

Na última alavanca, que traduzi como liderança ambidestra (originalmente dual-minded leadership), a ideia é administrar as tensões que surgem no caminho para alcançar objetivos duplos para tomar decisões estratégicas. “Essas tensões geralmente envolvem competição por recursos e visões divergentes sobre como atingir esses objetivos. Os líderes devem afirmar, incorporar e proteger tanto o lado financeiro quanto o social e lidar com as tensões de forma proativa”, recomendam as autoras. Nessa hora, é preciso coragem e inteligência para encontrar formas de conciliar curto prazo e longo prazo, impacto financeiro e social, retorno para acionistas e stakeholders.

Lembre sempre que saber (ou criar) o caminho mais adequado para cada organização é o verdadeiro X da questão. Não há só uma resposta certa ou só um caminho, pois estamos criando respostas para problemas inéditos. Como já se sabe, soluções “tamanho único” (one size fits all) costumam cair mal para quase todo mundo.

 

[Fonte: https://exame.com]